Entrevista: Conectacão – Gafanha da Nazaré 29.05.2018
Eneida Cardoso começou o seu percurso como psicóloga clínica, nos Açores, local onde conheceu e adoptou a Kaya, uma cadela que apresentava «alguns problemas de comportamento exigentes», que levariam à criação da Conectacão e à entrada de Eneida no mundo do comportamento canino.
 
AnimaDomus: Em que contexto surge a Conectacão?

Eneida Cardoso: A ConectaCão surgiu de uma forma muito simbólica e que se foi desenvolvendo numa verdadeira paixão. Existe desde 2014, altura em que iniciei o meu trabalho prático com cães. A escola, como espaço físico, existe desde Janeiro de 2016, sendo que até então realizava os meus treinos no domicílio ou em espaços públicos.
 
Fui estudando, aprendendo e treinando com a Kaya de forma praticamente auto-didata e aquilo que surgiu como uma necessidade, rapidamente se transformou num fascínio, paixão e até vocação.
 
Quando regressei a Aveiro, depois de 5 anos fora, decidi enveredar por um caminho diferente do que até então, em termos profissionais, e decidi dedicar-me a criar o meu próprio projeto.
 
A: Qual a importância do treino para o comportamento do animal?
 
Eneida Cardoso: O Treino é importante porque ajuda os humanos a compreender os cães e vice-versa. Somos espécies diferentes, com necessidades e formas de comunicar distintas e, para que convivamos em harmonia e com bem-estar (para ambos), tem de haver compreensão mútua e uma comunicação muito coerente e clara.
 
A grande maioria dos problemas de comportamento surgem porque existe uma comunicação confusa entre donos e os seus cães: os primeiros não são coerentes e claros na forma que comunicam com os cães e estes por sua vez, não compreendem aquilo que lhes é exigido na sociedade humana.
 
A: Existem vários tipos de treino no vosso espaço, qual a distinção entre eles?
 
Eneida Cardoso:  Os treinos são sempre adaptados às necessidades dos cães e das famílias que nos procuram – motivo pelo qual antes de qualquer aula, começamos sempre por fazer uma avaliação em que surge um diagnóstico (no caso dos problemas de comportamento) e um plano de treino ou protocolo de intervenção, que poderá consistir em aulas individuais, aulas de grupo ou ambas, conforme o que é pretendido para o cão em questão.
 
A: Para os donos, quais os benefícios de ter um animal que foi sujeito a treino, dos animais que nunca o fizeram?
 
Eneida Cardoso:  A diferença do ter ou não ter treino irá depender em grande parte dos detentores do cão e daquilo que são ou não capazes de alcançar com ele. A grande vantagem dos treinos (pelo menos os da Conectacão) é efetivamente ajudar na compreensão e comunicação do seu cão, o que consequentemente melhora a ligação afetiva existente entre cão e dono.
 
A: Qualquer comportamento que desvie o natural, pode ser solucionado em termos de treino? (ex. medo, agressividade, relação com outros animais, etc).
 
Eneida Cardoso: Não existem milagres e apesar de não gostar de dizer “nunca”, o “sempre” também se pode tornar perigoso em termos de expetativas. O que se tem de ter em consideração é que existem problemáticas de uma complexidade enorme porque são influenciadas por inúmeros fatores - genética, educação, contexto, técnicas de treino, características, dos donos do cão, etc – e que se torna irrealista assumir que todas serão controladas. Acredito porém, que a ajuda de um bom profissional será sempre útil.
 
A: Uma dica básica para os donos quando levam o animal à rua?
 
Eneida Cardoso:  O passeio é para o cão e se o objetivo é esse, deve-lhe ser permitido “ser cão”. Os cães conhecem o mundo com o olfato e por isso, deixar os cães cheirarem é um comportamento natural para eles que deve ser respeitado.
 
Ao contrário do que vejo muitas pessoas a fazer, os cães não têm de ir colados à nossa perna, deve-lhes ser dada alguma liberdade para explorar, respeitando sempre o espaço dos outros, e por isso, a trela, além de obrigatória por Lei, é um sinal de respeito e civismo.
 
A: Em que é que a Conectacão se distingue das outras escolas de treino?
 
Eneida Cardoso:  Penso que se distingue no simples pormenor de ter uma forte influência vinda da minha anterior prática como Psicóloga na área da Terapia e Intervenção familiar. Vejo as pessoas que me procuram e os seus cães como uma família, em que um dos elementos é diferente por ser uma espécie distinta da nossa.
 
O bem-estar do cão é SEMPRE respeitado - não utilizamos qualquer tipo de castigo físico nos cães, nem ferramentas de treino tradicionais e coercivas. Sinto que o fato de ser Psicóloga antes de Treinadora de Cães me torna uma melhor treinadora, porque tenho inevitavelmente o lado humano, tão importante nesta área também.
 
O facto de termos uma postura preocupada com causas sociais e acima de tudo educacionais também nos distingue – não vivemos isolados e sempre que possível organizamos eventos ou ações de sensibilização junto da comunidade, para que mais pessoas sejam informadas e educadas, principalmente aos mais novos – porque são eles o futuro da nossa sociedade e a mudança de mentalidades só será possível se for cultivada.